21% dos casos de câncer no Hospital Octávio Lobo são tumores do sistema nervoso central

Sintomas iniciais são inespecíficos e podem ser confundidos com as de outras doenças comuns na faixa etária infantojuvenil, o que dificulta o diagnóstico

Com apenas 1 e 3 meses, a pequena Maria Helena caiu e bateu a cabeça. Após o episódio, a criança começou a apresentar episódios de desmaios constantes. Um diagnóstico errado fez com que ela passasse anos recebendo tratamento contra epilepsia, sem apresentar melhora. Então, a mãe da menina, Ivone Moreira, de 46 anos, percebeu que algo grave acontecia com a filha, buscou uma segunda opinião médica e foi encaminhada para o Hospital Oncológico Infantil Octávio Lobo (Hoiol), quando Maria completou 5 anos. Ela foi diagnosticada com um câncer no cérebro, doença que afeta o órgão responsável pelo controle de todas as funções do corpo.

Não fosse a insistência de Ivone, o quadro da criança somente pioraria com o tempo. “Minha filha passou pela cirurgia, então a biópsia constatou um ependimoma e precisou de radioterapia. Agora passa por controle com consultas e exames periódicos, porque o câncer sumiu. Também faz fisioterapia por conta das sequelas na mão e perna do lado direito. Ela conseguiu participar da formatura da alfabetização no ano passado, todos diziam que ela não ia conseguir, foi muito emocionante. Hoje a minha filha cursa o primeiro ano do ensino fundamental.  Fico feliz por termos superado isso”, disse a mãe.

Os tumores do Sistema Nervoso Central (SNC) são comuns na infância, ficando atrás somente das leucemias, e a principal causa morte atribuída ao câncer nessa faixa etária. Dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca) apontam que o Brasil possui uma incidência de aproximadamente 5,65 casos novos por 100 mil crianças entre 0 e 14 anos e de 6,19 por 100 mil adolescentes de 15 a 19 anos. Para reduzir as consequências de um diagnóstico tardio, a Campanha Maio Cinza dissemina informações sobre os principais sinais e sintomas dessas doenças. Quanto mais cedo a detecção, melhor o prognóstico e chance de cura do paciente.

O câncer cerebral infantojuvenil, geralmente, se origina do crescimento de células embrionárias localizadas nos tecidos cerebrais, que se multiplicam de forma desordenada. Além disso, elas surgem em outros órgãos e instalam-se no encéfalo por meio da corrente sanguínea, contudo a metástase é rara na primeira infância. Os tipos mais frequentes são os gliomas, normalmente localizados na região do crânio próxima à nuca. Os demais são encontrados na porção superior do encéfalo, e recebem a classificação de astrocitomas, ependimomas, meduloblastomas (alto grau de malignidade) e craniofaringiomas.

Mas, identificar a formação de um tecido tumoral no cérebro é um desafio. As manifestações clínicas iniciais são inespecíficas e podem ser confundidas com as de outras patologias benignas, situação que pode retardar o encaminhamento para o Hoiol. A Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon), gerenciada pelo Instituto Diretrizes, sob o contrato de gestão com a Secretaria de Estado de Saúde Pública, recebeu 44 casos novos de tumores do Sistema Nervoso Central no ano passado, sendo 20 de tumores malignos e 24 tumores benignos. Em 2024, o hospital atendeu 18 casos novos até o momento, dos quais, oito são de tumores malignos e 10 de tumores benignos.

A neurocirurgiã pediátrica do Hoiol, Simone Rogério, destaca que o objetivo principal é fazer com que os profissionais de saúde da atenção básica reconheçam as características da doença e encaminhem os pacientes para hospitais de referência. “A partir da suspeita, a análise clínica identifica o histórico de evolução da doença, toda a sintomatologia e casos similares na família. Também são realizados exames físicos e de imagem, como tomografia e ressonância magnética para examinar o cérebro e a medula espinhal para definir o diagnóstico e fazer a programação cirúrgica, principal tratamento.”

“Alguns sintomas como dores de cabeça e vômitos frequentes são comuns e decorrentes do aumento da pressão intracraniana causada pelo desenvolvimento do tumor, outros sinais de alertas são distúrbios da marcha, visão dupla ou turva, sonolência, perda de equilíbrio e crises epilépticas. Os pais e educadores devem atentar se houve regressão em qualquer função neurológica ou ocorreu mudança de comportamento. E se essa criança apresenta dificuldade para executar uma habilidade já adquirida, como escrever e incoordenação motora. Essas queixas devem ser avaliadas por um especialista”, alertou a neurocirurgiã.

Simone Rogério destaca que as neoplasias do SNC representam 21% dos casos de câncer infantojuvenil. “A origem dos tumores cerebrais é desconhecida, porém cerca de 10% dos casos de câncer nesse público estão relacionados às anormalidades genéticas ou hereditárias. É impossível prevenir o surgimento desses tumores, mas o diagnóstico precoce ajuda a ter um melhor prognóstico para fazer uma intervenção cirúrgica e uma ressecção quando a lesão está pequena, tratamento complementar e melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Em alguns casos, a cura é possível. Em outros, consegue-se o controle a longo prazo.”

Moradora do município de Cametá, nordeste paraense, Lidiane Cantão, de 33 anos, acompanha o filho João Renan, de 8 anos, em tratamento de um tumor benigno desde 2021, no Hoiol.  “Ele foi diagnosticado em Cametá e referenciado para o ‘Octávio Lobo’.  Foi tudo rápido e, mesmo com a cirurgia, meu filho não teve implicações, leva uma vida normal como de qualquer outra criança, estuda e brinca muito com os seus bonecos de super-heróis”, afirmou.

“Os casos benignos são curados com a cirurgia, quando é possível retirá-los completamente, senão são prescritos tratamentos complementares. Já os tumores malignos, além da cirurgia, precisam de quimioterapia e radioterapia, a depender da idade, do tipo histológico do tumor, das alterações moleculares e genéticas associadas”, esclareceu Simone Rogério.

O Hospital Oncológico Infantil dispõe de todos os recursos para prestação de assistência especializada de alta complexidade, para diagnóstico definitivo e tratamento dos tumores benignos e dos cânceres cerebrais prevalentes na infância e adolescência. 

O Serviço é desenvolvido por uma equipe multidisciplinar, desde a realização de exames de investigação até a execução de procedimentos neurocirúrgicos complexos e seguimento com a oncologia pediátrica.